Na Telinha - Inacreditável

16 de setembro de 2019

Título: Inacreditável (Unbelievable)
Temporada: 1 | Episódios: 8
Distribuidora: Netflix
Elenco: Kaitlyn Dever, Merritt Wever, Toni Collette, Danielle Macdonald
Gênero: Drama/Policial
Ano: 2019
Duração: 45min
Classificação: +16
Nota: ★★★★★
Sinopse: Uma jovem é acusada de falsa denúncia de estupro. Anos depois, duas investigadoras encaram casos assustadoramente parecidos.

Inacreditável é uma minissérie cujo roteiro foi uma adaptação bem fiel do livro Falsa acusação: Uma história verdadeira (publicado pela Editora Leya), baseado numa história real. Ela conta os detalhes da injustiça sofrida em 2008 por Marie Adler, uma jovem de dezoito anos que decide denunciar ter sido vítima de um estupro, mas além de ter sido desacreditada pela policia e por pessoas próximas, ainda foi levada a mudar seu depoimento inicial como se ela estivesse mentindo, e depois foi processada por falta acusação. Três anos depois, outro caso de estupro bem semelhante ao de Marie foi denunciado por outra jovem, mas agora, com Karen Duvall - uma mulher - a frente do caso, tudo é tratado de forma bem diferente. Durante as investigações, Karen encontra um padrão e acaba sendo levada a outros casos parecidos que ocorreram em outros distritos, e assim ela une forças com a investigadora Grace Rasmussen numa tentativa de não só descobrirem quem é o maníaco a solta que anda atacando mulheres, como também dar apoio às vítimas que carregariam as sequelas desses ataques para o resto de suas vidas.


Com um tema tão delicado sendo abordado, é impossível assistir à minissérie sem sofrer junto com as personagens, seja pela forma como elas lidam com essa tragédia, ou como as pessoas reagem a isso.
Marie Adler, que sempre viveu em lares adotivos, já não tinha uma vida muito fácil. Ela sempre foi uma garota introspectiva, sem muitos amigos e sem ter com quem contar. Com a agressão que sofreu, ela fica totalmente abalada, mas em vez de receber apoio, só recebe críticas, julgamentos e questionamentos acerca de seu depoimento que, pra polícia, "não faz sentido". Os investigadores não tem pistas do agressor, não há testemunhas, eles ficam insistindo a todo momento para que ela repita o mesmo relato por incontáveis vezes em busca de inconsistências - mas fazendo com que ela reviva aqueles momentos pavorosos em sua cabeça -,sua mãe adotiva a condena por ter um comportamento inadequado fazendo comentários desnecessários e levantando dúvidas diante dos investigadores sobre que tipo de garota ela é, ela passa por diversos procedimentos e exames médicos incômodos e invasivos em busca de provas, mas a única coisa que ela queria era que tudo aquilo acabasse. Mas, por sua reação ter sido considerada "inadequada", os policiais, totalmente incompetentes e sem terem a menor ideia do que fazer para pegar o criminoso por não haver pistas, começam a pressioná-la para que ela confesse que tudo não passou de invenção, que ela só fez aquilo para chamar atenção, e assim eles pudessem encerrar o caso. E Marie, acaba cedendo à pressão. Com isso ela passa a ser evitada por amigos por causa de sua "mentira", começa a ter problemas no trabalho, pensa em suicídio, suas feições mudam e a dor, a impotência e a apatia ficam estampadas em seu rosto, ela precisa se mudar de casa pra tentar se afastar dos julgamentos alheios, se sente perseguida e insegura a todo momento, sofre com as notícias sobre sua falsa acusação na mídia, e sua vida, além de ter ficado marcada pra sempre devido a agressão, ainda vira um verdadeiro inferno.


Em contrapartida, o tom dos episódios é bastante diferente quando são as mulheres que estão liderando as investigações dos demais casos de estupro. A sensibilidade em conversar com as vítimas, lhes dando tempo e compreendendo que cada uma reage de uma forma, e sem duvidar da palavra delas em momento algum, independente de quem sejam, mostra que só as mulheres realmente entendem o que é passar por algo do tipo. O empenho delas durante as investigações é incrível, e por mais que seja um trabalho muito exaustivo e que faz com que elas abram mão de boa parte de suas vidas sociais, mostra que a ideia é ajudar as mulheres a se sentirem mais seguras ao tirar esse maníaco de cena para que ele não faça mais vítimas. E, nesse caso, as vítimas não seguiam um padrão. Foram mulheres mais novas ou mais velhas; negras, ou brancas; gordas ou magras... não importava quem fosse, desde que ele pudesse estar no controle as tratando como presas, e cada uma lidou de forma diferente com o ocorrido. É impossível não ficar agoniada torcendo para que o canalha seja encontrado logo e apodreça atrás das grades para pagar por tudo o que fez a elas.


No desenrolar na série, mesmo que não seja o foco, há várias cenas e diálogos que levantam reflexões, apontando casos como exemplo em que há mulheres que só querem prejudicar o homem com quem se envolveram e o acusam falsamente, enfraquecendo o movimento ou fazendo com que a polícia perca tempo com mentiras, enquanto casos de verdade são desacreditados ou não tratados por causa desses outros. Porém, dentro do contexto da série, são informações dadas por homens, esses machistas idiotas e depravados que acham que se a mulher é estuprada foi porque ela "mereceu", porque se comportou de forma "imprópria", porque bebeu demais, porque se vestiu de forma "inadequada", e coisas do tipo. E é triste saber que também há mulheres que tem o mesmo pensamento, e a mãe adotiva de Marie é exemplo disso. Logo, fica claro que quando são homens que estão a frente do caso, o crime não é tratado da forma que deveria ser e muitas vezes em vez de ajudar, só piora tudo.


O único ponto que eu cheguei a considerar negativo na minissérie, foi alguns diálogos com exposições baratas contendo explicações para alguns procedimentos investigativos. Não sou nenhuma crítica de cinema profissional, mas eu reparo em várias coisas que podem ser consideradas "técnicas" e que acabam interferindo na minha experiência. O que quero dizer com isso é que alguns diálogos servem para que as personagens expliquem, por exemplo, o que é ou como funciona algum tipo de teste, exame, ou o que quer que seja que a policia faça na tentativa de identificar um suspeito, porém, essas explicações são dadas dentro de um contexto onde as personagens, que já são profissionais, não precisariam de explicações pois já sabem como funciona. Quem precisa de explicações é o público, logo essas informações poderiam ser dadas de forma diferente, para um personagem que não tivesse ligação com o trabalho da polícia ou que não tenha conhecimento sobre aquilo para que essas informações tenham uma verdadeira utilidade e a cena pareça mais crível.


No mais, a minissérie é excelente e muito realista, daquelas que mexem com nosso psicológico por dias a fio. A forma como as investigações são conduzidas até conseguirem chegar ao criminoso (com muita dificuldade por sinal) é genial, e a ligação que Marie tem com as investigadoras ao final é emocionante e recompensadora. Tudo mostra que quando são mulheres fazendo um trabalho para mulheres, as coisas mudam de figura e funcionam como deveria, pois só uma mulher consegue se colocar no lugar de outra e imaginar o que esse tipo de trauma pode causar. Pode ser um pouco difícil, doloroso e revoltante acompanhar os episódios, vendo as injustiças sofridas por Marie e como as vítimas tiveram suas vidas marcadas por essa tragédia, mas talvez seja necessário pra que muitas pessoas, inclusive homens, consigam enxergar o quanto esse trauma é devastador na vida da vítima.

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